BACK IN BAHIA

(1972, gravada em Expresso 2222, 1972.)

Escolhida por Pedro Gil

 

Lá em Londres, vez em quando me sentia longe daqui

Vez em quando, quando me sentia longe, dava por mim

Puxando o cabelo

Nervoso, querendo ouvir Celly Campelo pra não cair

Naquela fossa

Em que vi um camarada meu de Portobello cair

Naquela falta

De juízo que eu não tinha nem uma razão pra curtir

Naquela ausência

De calor, de cor, de sal, de sol, de coração pra sentir

Tanta saudade

Preservada num velho baú de prata dentro de mim

Digo num baú de prata porque prata é a luz do luar

Do luar que tanta falta me fazia junto com o mar

Mar da Bahia

Cujo verde vez em quando me fazia bem relembrar

Tão diferente

Do verde também tão lindo dos gramados campos de lá

Ilha do Norte

Onde não sei se por sorte ou por castigo dei de parar

Por algum tempo

Que afinal passou depressa, como tudo tem de passar

Hoje eu me sinto

Como se ter ido fosse necessário para voltar

Tanto mais vivo

De vida mais vivida, dividida pra lá e pra cá

Comentário de Gil: Era o primeiro verão na Bahia depois que eu tinha voltado de Londres, e eu fui à festa de Nossa Senhora da Conceição em Santo Amaro da Purificação. Eu estava na casa onde Canô, mãe de Caetano, estava dando a festa; vendo as pessoas queridas e a alegria que emanava delas, da lembrança da saudade que eu sentia dessas e outras coisas em Londres veio o impulso para escrever a canção – que eu comecei ali, letra e música juntas, de cabeça, e complementei no dia seguinte, já na casa de Sandra, na Graça, em Salvador.

'Back in Bahia' se baseia em motivos musicais muito íntimos, nordestinos – improviso, embolada, galope, martelo –, e em modos cordélicos, com rimas rítmicas [e também internas], típicas do versejar nordestino, e versos simétricos [quase todos de 16 sílabas]: entre eles, o ‘de vida vivida dividida pra lá e pra cá’, de que eu mais gosto: poesia pura, concreta, como o ‘fazer o canto cantar o (rimando com cântaro) o cantar’, em 'Palco'.”